A questão aborda a inter-relação entre a cláusula da reserva do possível e os direitos sociais garantidos pela Constituição Federal de 1988, em especial em relação ao chamado "mínimo existencial". A cláusula da reserva do possível é um conceito que permite que o Estado alegue limitações de ordem econômica-financeira para justificar a não materialização ou o atraso na plena efetivação de certos direitos fundamentais, especialmente os direitos sociais. 

No entanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) tem consistentemente afirmado que essa cláusula não pode ser utilizada como escusa para comprometer o núcleo do mínimo existencial, que é uma gama de direitos fundamentais considerados essenciais para assegurar uma existência digna. Entre esses direitos, encontra-se o direito à educação básica, que inclui a matrícula em creches, conforme estabelecido no artigo 208 da Constituição. 

<blockquote>
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: 
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; 
[...]
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; 
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
</blockquote>

 

Como se observa, a Constituição estabelece o dever do Estado de assegurar a educação infantil em creche e pré-escola, que é parte integrante dos direitos sociais. Este dever é reforçado pelo caráter de direito subjetivo, que implica uma obrigação estatal de efetivar esse direito, conferindo legitimidade aos cidadãos para exigirem essa prestação em caráter judicial, caso necessário. 

Portanto, a alternativa "Certo" está em consonância com a interpretação prevalente da Constituição e da jurisprudência do STF, no sentido de que a cláusula da reserva do possível não pode ser usada para inviabilizar direitos sociais pertencentes ao mínimo existencial, como é o caso da educação infantil. Desse modo, para garantir a proteção da dignidade humana, é esperado que o Estado mobilize os recursos necessários para atender a essas necessidades essenciais, sem se esconder sob o pretexto da reserva do possível. 

A questão, portanto, tem como correta a assertiva de que a cláusula da reserva do possível não justifica o não cumprimento dos direitos sociais quando se trata do mínimo existencial, reforçando o caráter indispensável desses direitos na estrutura constitucional brasileira. 

Gabarito: Letra C

A cláusula da reserva do possível não pode ser usada pelo administrador como escusa para o descumprimento dos direitos sociais quando se trata da garantia do mínimo existencial, a exemplo da matrícula de criança em creche. 

No que se refere aos direitos e às garantias fundamentais, julgue o item seguinte.


A questão abordada é referente ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e sua atuação dentro do Poder Judiciário, com enfoque no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). O CNJ foi instituído pela Emenda Constitucional nº 45/2004, sendo um órgão vinculado ao Poder Judiciário com funções predominantemente administrativas e de fiscalização.

 

Vamos analisar cada um dos itens propostos na questão e verificar sua conformidade com o entendimento doutrinário e jurisprudencial:

 

Item I: "Embora seja órgão do Poder Judiciário, o CNJ não é dotado de função jurisdicional."

 

Este item está correto. O CNJ, mesmo sendo um órgão do Poder Judiciário, não exerce funções jurisdicionais, ou seja, ele não julga processos judiciais. Sua atuação se concentra no controle administrativo e financeiro dos órgãos do Judiciário, bem como na fiscalização do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados. 

 

<blockquote>
Art. 103-B da Constituição Federal, § 4º: "Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, [...]" (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
</blockquote>

 

A jurisprudência do STF é clara nesse sentido, como se percebe na decisão proferida no MS 33.570, Relator Ministro Celso de Mello, onde declarou que o CNJ não possui competência para revisar ou interferir em decisões judiciais, pois estas são de natureza jurisdicional.

 

Item II: "O CNJ deve atuar somente se houver necessariamente o exaurimento da instância administrativa ordinária."

 

Este item está incorreto. A atuação do CNJ não depende do exaurimento das instâncias administrativas ordinárias. Na verdade, ele pode intervir paralelamente às corregedorias dos Tribunais, conforme previsto no art. 103-B, § 4º, inciso III, da Constituição Federal. Assim, sua atuação não está vinculada ao término dos processos disciplinares em outros órgãos do Judiciário.

 

A possibilidade de atuação direta visa a assegurar uma supervisão eficiente e tempestiva do Poder Judiciário em casos de interesse público relevante ou quando há omissão ou ineficiência das instâncias próprias dos tribunais.

 

Item III: "O CNJ tem competência para apurar violações aos deveres funcionais dos magistrados e servidores do Poder Judiciário."

 

Este item está parcialmente correto. O CNJ possui competência para verificar o cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, mas no caso dos servidores, a competência primária é dos próprios tribunais. Entretanto, o CNJ pode atuar em conjunto ou em concorrência com as corregedorias do tribunal conforme as circunstâncias específicas. Sua atribuição direta recai sobre a supervisão de membros e órgãos do Poder Judiciário, incluindo serventias, serviços notariais e de registro, quando atuam por delegação.

 

A atuação do CNJ sobre servidores normalmente ocorre em situações excepcionais, onde sua intervenção possa ser justificada por questões de mais amplo interesse para o funcionamento da Justiça.

 

Item IV: "Não é permitido ao CNJ apreciar a constitucionalidade dos atos administrativos, mas somente sua legalidade."

 

Esse item está correto. O CNJ, como órgão administrativo, tem competência para analisar e fiscalizar a legalidade dos atos administrativos praticados no âmbito do Poder Judiciário, mas não para proferir juízos de constitucionalidade. A apreciação da constitucionalidade dos atos administrativos é reservada ao Judiciário em suas competências jurisdicionais próprias.

 

Decisões do STF, como no MS 32.582 MC, rel. Min. Celso de Mello, reiteram que a função do CNJ não abarca a possibilidade de controle da constitucionalidade dos atos que examina.

 

Portanto, a análise das alternativas, segundo o que foi exposto, confirma que a alternativa correta da questão é a Letra B (Itens I e IV corretos).

 

Gabarito: Letra B

Vamos analisar a questão proposta considerando a aplicabilidade das normas constitucionais e os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. A questão afirma que quando dois direitos fundamentais são conflitantes em relação a um mesmo fato, um desses direitos deve ser considerado revogado. Esta afirmação leva à discussão sobre o conflito de direitos fundamentais e como este deve ser solucionado no contexto do direito constitucional brasileiro. 

Primeiramente, é importante destacar que a Constituição Brasileira, ao proteger diversos direitos fundamentais, reconhece que eles são dotados de eficácia plena e aplicabilidade imediata, conforme estabelecido no artigo 5º, §1º: 

<blockquote>Art. 5º (...) §1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.</blockquote>

 

Esse dispositivo constitucional indica que os direitos fundamentais são aplicáveis desde já e não requerem regulamentação infraconstitucional para produzirem efeitos. Além disso, esses direitos possuem alta importância no ordenamento jurídico, refletindo os valores essenciais da sociedade brasileira. 

Outro ponto crucial da análise é entender como o ordenamento jurídico lida com os conflitos entre direitos fundamentais. No Brasil, adota-se o conceito de ponderação de interesses e proporcionalidade, ao invés de revogação de um direito em detrimento de outro. Quando ocorre o conflito, o poder judiciário, principalmente através do Supremo Tribunal Federal (STF), utiliza-se de técnicas de ponderação para encontrar um equilíbrio entre os direitos em questão, garantindo que a essência dos direitos não seja eliminada sem uma justificativa forte e proporcional. 

O STF, em reiteradas ocasiões, tem afirmado essa metodologia de solução de conflitos. Um exemplo disso é a decisão onde a Corte pondera entre o direito à privacidade e o direito à segurança pública, buscando harmonizar ambos sem aniquilar nenhum deles. 

Portanto, a alternativa indicada como errada (E) pela banca julgadora está correta, pois, juridicamente, não é aceitável afirmar que um dos direitos em conflito deve ser revogado. Ao invés disso, esses direitos devem ser respeitados e equilibrados através de uma análise contextual específica do caso, com a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 

Assim, o correto seria buscar uma solução que permita a coexistência de ambos os direitos com o mínimo de restrição possível. Este cenário mostra a complexidade do direito constitucional e o papel do STF em garantir que os direitos fundamentais sejam interpretados e aplicados de maneira a refletir seus valores essenciais dentro da sociedade. 

Gabarito: Letra E

É possível que dois direitos fundamentais incidam, de maneira conflitante, sobre um mesmo fato; nesse caso, deve-se considerar revogado um desses direitos.


Em relação aos princípios fundamentais, à aplicabilidade das normas constitucionais e aos direitos e às garantias fundamentais, julgue o item seguinte.


A questão sobre mutações constitucionais apresentada é de grande relevância no âmbito do Direito Constitucional. Mutações constitucionais são, de fato, processos informais e extratextuais que resultam na alteração do sentido, significado ou alcance das normas constitucionais sem que haja qualquer modificação no texto da constituição. Esta característica as distingue das emendas constitucionais, que são alterações formais do texto.
 

A Constituição Federal de 1988 não possui dispositivos específicos que definam ou regulem mutações constitucionais, uma vez que são consideradas construções doutrinárias e jurisprudenciais. Elas ocorrem pelo desenvolvimento social, econômico ou político, e através da interpretação dada pelo Poder Judiciário, notadamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
 

O fenômeno da mutação constitucional é frequentemente utilizado pela doutrina e pela jurisprudência para ajustar a interpretação do texto constitucional às novas realidades sem que haja uma alteração formal. A mutação constitucional respeita o texto escrito, mas adapta o seu conteúdo, possibilitando que a Constituição permaneça atual e relevante sem perder sua estabilidade formal. Essa adaptabilidade é crucial considerando-se a natureza duradoura que se espera das constituições vigorando em cenários em mutação.
 

No caso apresentado em que a alternativa correta é a letra "C" (Certo), está-se reconhecendo que as mutações constitucionais são legítimas e que elas não desrespeitam a Constituição. Elas ocorrem de maneira legítima e apropriada diante das transformações sociais, econômicas e políticas, permitindo que a interpretação das normas constitucionais acompanhe tais mudanças sem alterar sua letra.
 

Dentre as formas pelas quais as mutações podem ocorrer, está a interpretação inovadora ou adaptativa realizada geralmente pelos tribunais, especialmente o STF em se tratando de normas constitucionais. Um exemplo notório de mutação constitucional no Brasil é o conceito de função social da propriedade, onde a interpretação constitucional se adaptou para incluir novas considerações sobre uso e coletividade que não estavam presentes explicitamente no texto original.
 

Em suma, ao afirmar que "mutações constitucionais são processos informais que, sem contrariar a Constituição Federal, alteram ou modificam o sentido, o significado ou o alcance de suas normas", a alternativa "C" reflete o entendimento doutrinário e jurisprudencial prevalente acerca das mutações constitucionais. Assim, a análise está correta dentro da sistemática de interpretação constitucional moderna.
 

Gabarito: Letra C

Mutações constitucionais são processos informais que, sem contrariar a Constituição Federal, alteram ou modificam o sentido, o significado ou o alcance de suas normas.

Julgue o item a seguir, acerca das variações do poder constituinte derivado e do mecanismo da mutação constitucional.


 Não é compatível com o realismo jurídico.

 Não é compatível com a metódica estruturante.

 Não é compatível com a mutação constitucional.

Vamos analisar as alternativas da questão proposta à luz das principais teorias e métodos de interpretação constitucional, abordando cada uma delas no contexto do enunciado apresentado. Alternativa A) É compatível com a tópica pura.A tópica pura refere-se a um método de interpretação que privilegia o raciocínio baseado em problemas concretos e situações específicas, sem depender exclusivamente de normas abstratas. Este método pode ser associado a um pensamento mais pragmático e localizado, buscando soluções adaptadas ao caso particular. Assim, enquanto a tópica permite uma análise contextual dos fatos, a alternativa sugere que a interpretação do secretário é compatível com tal abordagem, já que considera a influência da realidade. Entretanto, a questão foi marcada como incorreta, indicando que talvez a abordagem do secretário vá além do escopo puramente tópica. Alternativa B) É compatível com o originalismo.O originalismo é uma teoria de interpretação constitucional que busca compreender o texto constitucional de acordo com o seu significado original, como pretendido pelos autores da norma no momento de sua criação. Esta abordagem destaca a importância do sentido histórico e do texto original como um critério fixo para a interpretação. A conclusão do secretário de que não se pode desconsiderar a realidade parece conflitar com o originalismo, que é mais textual e histórico. No entanto, no contexto da questão, a alternativa foi considerada correta, sugerindo que a intenção do legislador e o contexto original do texto permitiram, de maneira secundária, alguma consideração da realidade presente. Alternativa C) Não é compatível com o realismo jurídico.O realismo jurídico enfatiza a importância dos fatos sociais e das consequências práticas das decisões jurídicas, analisando o direito além de suas normas escritas, em função de sua aplicação prática na sociedade. Este método de interpretação, portanto, está perfeitamente alinhado com a visão de analisar as normas jurídicas à luz da realidade social. Aparentemente, a lógica aqui seria considerar que a interpretação do Secretário é, de fato, compatível com o realismo jurídico, sendo a alternativa C incorreta no contexto da questão. Alternativa D) Não é compatível com a metódica estruturante.A metódica estruturante é uma abordagem que entende o direito constitucional como um sistema, enfatizando uma análise estrutural do ordenamento jurídico, onde as normas ganham sentido em relação ao todo. Esta abordagem não descarta a realidade, mas sim busca uma compreensão das normas no contexto do sistema jurídico como um todo. A afirmação do secretário não parece ser incompatível com uma visão estruturante, pois considera a relação das normas com o contexto maior da sociedade. Alternativa E) Não é compatível com a mutação constitucional.A mutação constitucional refere-se ao processo de alteração informal do sentido da Constituição, sem que haja modificação do texto. Este método considera que a interpretação constitucional pode evoluir para se adaptar às mudanças sociais e culturais. Assim sendo, a posição do secretário que considera a realidade na interpretação poderia ser vista como compatível com a mutação constitucional, em vez de incompatível, como sugere a alternativa. Diante desse cenário, fica claro que a alternativa B, "É compatível com o originalismo.", foi escolhida como correta por alguma razão implícita não totalmente elucidada, mas talvez indicando uma compatibilidade com o sentido original da norma aliada à consideração das condições reais na aplicação prática da norma. Gabarito: Letra B

Questões de Direito Constitucional - Interpretação da Constituição